16.9.09

adrenalina gratuita

Aconteceu algo inusitado comigo na semana passada, enquanto voltava de Porto Alegre - ou melhor, de Farroupilha, onde passei o feriado de Sete de Setembro. Como sempre, foi bom estar em casa e não deixei de sentir a confusão habitual de "não sei bem se tenho vontade de estar aqui mas de qualquer jeito preciso ir embora".

Enfim, o insólito aconteceu quando meu aviãozinho da Gol foi atingido por um raio, enquanto passávamos por nuvens escuríssimas e por uma tempestade muito forte – que eu descobri depois ser a parte do aguaceiro que caía sobre São Paulo, fazendo a cidade parar de vez.

Como sou a legítima pobre que não dispensa uma janela na hora de viajar, assisti a todo o evento de camarote – ainda mais porque eu estava com a carinha encostada na janela naquele momento. É um tanto óbvio dizer que foi tudo muito rápido, mas não tem como não citar porque é justamente uma das coisas que mais impressiona. É em um piscar de olhos que tudo acontece, e só o que eu via era um facho de luz

A impressão que dava, no momento em que o raio veio, era de que uma das turbinas estava pegando fogo porque saíam faíscas do tal facho de luz, que iam ficando maiores à medida em que se digiria para o pára-raios no fim do aparelho.

Assim como é desnecessário dizer que tudo aconteceu rápido o mesmo vale para meu estado de espírito na hora. Eu fiquei tão assustada, inclusive com o estrondo no momento da batida, que mal consigo lembrar o que houve naqueles instantes. Só consigo recordar da sensação ruim - era um pavor tão grande, porque eu tinha certeza de que o avião ia cair. Afinal, eu praticamente vi a asa pegando fogo.

Em instantes, porém, tu percebes que o avião deu aquela chacoalhadinha mais forte mas segue viagem. Uma senhora muito simpática que estava ao meu lado, voltando com o marido para Recife, acordou do seu cochilo em um sobressalto e me perguntou o que havia aconteceu. Minhas mãos suavam muito e eu só sentia o coração, aos poucos, voltando para o seu lugarzinho de origem.

Como não sou uma pessoa muito acostumada a andar de avião, fiquei me perguntando na hora, como uma jeca tatu, se era comum caírem raios assim, à toa, nos aparelhos. Pela reação daquelas pessoas, visivelmente viajantes, no entanto, não dava a impressão de ser assim tão usual.

Pelo que percebi, todos pareciam questionar a pessoa ao lado sobre o que havia acontecido e muitos pediam uma explicação aos comissários de bordo. Gentilmente e enquanto serviam água para os mais assustados, os funcionários explicavam que realmente foi um raio, com um ar de “de vez em quando acontece”.

Bom, o raio só foi mesmo o início de uma viagem horrorosa, que eu considerava boa até então por ter conseguido uma excelente promoção para aquele vôo, direto, sem escalas. Já saímos meia hora atrasados de Porto Alegre e eu começava a achar que demoraria mais do que pretendia para chegar no trabalho.

Até aí, tudo bem. Mas, na hora de descer no aeroporto de Guarulhos, com o povo todo tenso por causa do raio e com uma mulher atrás de mim gritando “desce pelo amor de Deus”, me deixando mais nervosa do que já estava, o avião não consegue aterrissar e arremete. Aí começa a voar mais alto, mais alto, mais alto...

Como chovia demais em São Paulo, fomos parar em Campinas. Uma hora e meia parados, sem comida, sem bebida, sem poder descer da nave e, no meu caso, com a bateria do celular (já sem crédito) acabando.

O pior de tudo ainda era a gritaria que aqueles companheiros de vôo faziam. Tinha gente de várias nacionalidades e partes do país. Estava todo mundo no mesmo ‘barco’, mas cada um queria saber do seus horários. Não sei se os outros têm que trabalhar ou viajar, mas eu estou atrasado. Uma das maiores lições de egoísmo e histeria coletiva que eu já presenciei. Isso incomodou mais meu estômago vazio do que o cheiro de gasolina que abastecia o avião.

Saindo de Campinas, depois de muito bate-boca, cada qual querendo atribuir mais culpa à Gol e aos seus comissários pela chuva que caía e que fechava os aeroportos, conseguimos sair de Viracopos e voar em direção a Guarulhos. Antes de chegar ao destino já sonhado àquelas alturas, nova arremetida – continuava chovendo muito forte. Ainda bem que não durou muito o tempo de espera voando e conseguimos descer logo.

Senti um alívio gigante quando o avião parou, até porque não agüentava mais olhar para aquela asa e ficar imaginando que haveria algum problema depois do raio que caiu – sim, houve manutenção, mas os meus nervos não queriam saber de lógica depois de tantas aventuras.

Na chegada, nova aula sobre "seja um ser humano mesquinho". Pelo jeito, só a senhora ao meu lado e mais uma ou outra pessoa pareciam satisfeitas por estar inteiras depois do que aconteceu. Em vez de alívio, todos sentiam raiva e indignação pelo atraso, por terem perdido seus compromissos ou seus vôos seguintes. Um homem de meia-idade chegou a resmungar "era melhor que tivesse caído, pelo menos durava dois segundos, seria rápido”. Vontade grande de xingá-lo, mas me segurei.

Só queria me livrar logo daquela gente estressada e pegar minhas malinhas antes do retorno para casa, já que a terça-feira já era e eu só voltaria a ser uma pessoa novamente na quarta. Ainda mais quando os comissários começaram a comentar “hoje deu tudo errado, teve até raio”. Ou seja, estavam nos enganando e não era tão comum quanto queriam nos fazer acreditar.

Dias depois, cheguei a ler na internet que as possibilidades, hoje, são muito pequenas de um avião ser derrubado por um raio. Segundo o Mr. Google, os últimos acidentes do tipo ocorreram na década de 1960, justamente pela implantação dos pára-raios que seguram impulsos ferozes da natureza como esse que nos visitou.

Embora eu não tenha estado perto da morte, como pareceu na hora, a dramática que existe em mim não deixou de sentir um grande alívio por tudo ter corrido bem. Como diz o Niemeyer naquele documentário, a vida é mesmo um sopro.

5 comentários:

Vicente Fonseca disse...

Graças a Deus, nunca estive num avião atingido por raio. Deve ser terrível a sensação de completa impotência diante do que está acontecendo.

natusch disse...

O máximo que já peguei em avião foi uma turbulência, daquelas bem leves mesmo... Fora isso, só alegria. Mas a gritaria deve ser horrível, mesmo - dá vontade de fazer como naquela cena clássica de "Apertem os cintos, o piloto sumiu" e fazer fila para espancar a fiasquenta da vez... =P

Juliano Tatsch disse...

Bah, eu tenho esse filme em DVD meu caro Natusch. É genial. Vendo pelo lado positivo da coisa, tens uma boa história para contar Pati. E sim, os voos da Gol deixam muito a desejar mesmo. Pelo menos os que eu fiz e comparando-os com os da Tam. Abç.

PAULA SALOMÃO disse...

Pati, vou te dar o endereço da minha avó que mora lá em Campinas, Da próxima vez, passa lá pra dar uma descansada, amiga!
Beijão

Pati Benvenuti disse...

hhahah
valeu, paula!