"No Grande Hotel, encontrei Mercedes no meu quarto.
“Lavei tua roupa suja e botei para secar no banheiro”, disse Mercedes. Cuecas, camisas e meias estavam dependuradas na barra de alumínio que segurava a cortina do box do chuveiro.
“Para encontrar a roupa tive que revistar as tuas coisas. Você sempre põe a roupa suja dentro da mala¿”
“Você está muito bonita hoje.”
“Bonita¿ Eu¿” Mercedes caminhou na direção do banheiro, para se olhar no espelho. Fui atrás.
“Estou bonita nada”.
“Está linda”.
“Como foi em Quijarro¿”
“Fuentes se encontrou com o outro homem que estou procurando. Rafael. Amanhã vão se encontrar novamente em Porto Suárez.”
“Eu fico melhor com o cabelo solto ou preso¿”
“Solto, sem laquê.”
“Eu já não uso mais laquê.”
“É assim que eu gosto.”
“Você gosta mesmo de mim¿”
“Muitos anos antes de Cristo havia na Grécia um poeta, Arquíloco, que dizia: ‘Tenho uma grande arte: eu firo duramente aqueles que me ferem’.”
“Às vezes você parece maluco. Não sei do que você está falando.”
“Minha arte é maior ainda: eu amo aqueles que me amam.”
Acendi um Panatela. Deitamos na cama.
“Numa história que li, um homem condenado à morte está no patíbulo para ser enforcado e quando o carrasco lhe coloca a corda no pescoço ele pede que lhe dê mais um minuto de vida. ‘Para que queres mais um minuto de vida¿, perguntou o carrasco. Responde o condenado ‘Quero pensar ainda um minuto na Belle Elize’.”
Começamos a brincar um com o corpo do outro, usando as mãos e a boca, entretendo-nos mutuamente, provocando e estimulando o desejo da carne, com a urgência das pessoas acossadas.
“Você também suplicaria por um minuto mais de vida para pensar numa mulher¿”
“Ele era um marinheiro. A Belle Elize era uma escuna, na qual ele navegava pelos mares do mundo."
(Rubem Fonseca - A Grande Arte)
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